quarta-feira, 25 de novembro de 2009

Método para Estudar os Fac-Símiles

Por John Gee
Revisão de Allen J. Fletcher. "A Study Guide to the Facsimiles of the Book of Abraham".

O facsimile do Livro de Abraão continua a nos fascinar, mesmo quando não o entendemos. É a única ilustração de nossas escrituras, eles atraem nossa atenção não apenas por serem rudimentares, mas também por existir em meio às palavras escritas.

Sua origem incomum e iconografia estrangeira torna-o grande fonte de especulação desinformada. Um dos que se pôs como guia para os fac-símiles foi Allen J. Fletcher.

Abordagem

A questão vital sobre os fac-símiles é como as interpretações de Joseph Smith coincidem com a dos antigos Egípcios. Fletcher vai de figura em figura, no fac-símile, com três perguntas na mente: (1) "O que essa figura representa no mundo dos Egípcios?" (2) "Qual significado é dado para esta figura pelo profeta Joseph Smith ou Abraão?" e (3) "Se eu olho para esta figura Egípcia como uma imitação, que princípios do Evangelho posso ver nela?" Essa são questões relevantes. Nem todos, contudo, responderão da mesma maneira.

A resposta para a segunda questão é geralmente simples, mesmo que possa ter alguns pontos de vista do próprio Fletcher, elas não modificam o sentido do significado. As respostas de Fletcher para a terceira questão são homiléticas (a aplicação dos princípios gerais da retórica para o fim específico da pregação pública) que eu levarei em consideração a posição do Livro de Mórmon que diz que "tudo o que impele à prática do bem e persuade a crer em Cristo é enviado pelo poder e dom de Cristo" (Morôni 7:16) e assim me conterei de fazer críticas a ele. São as respostas de Fletcher para a primeira questão que discordo (e elas, claro, tem influência direta nas bases das homiléticas de Fletcher). Não concordo com as respostas dele porquanto discordo de muitas suposições de Fletcher e de seu método. Não vou analisar a maioria de suas suposições, em vez disso, o foco será em seu método.

Em direção a uma Metodologia para o Estudo dos Fac-Símiles

O método de Fletcher para entender os pontos de vistas dos fac-símiles dos antigos Egípcios é simplesmente arbitrário. Fletcher caiu em uma armadilha comum quando lidou com os fac-símiles com uma visão de egiptólogos. Nós queremos saber: X (a interpretação de Joseph) = Y (a interpretação dos antigos Egípcios)?

Mas na realidade a questão é constante e ligeiramente modificada pela questão: X (a interpretação de Joseph) = Z (a interpretação dos modernos Egiptólogos)?

Como já tinha demonstrado tecnicamente em outro lugar (pelo menos para o fac-símile 2), Z (a interpretação dos modernos Egiptólogos) geralmente não é igual a Y (a interpretação dos antigos Egípcios).1 Portanto Z é irrelevante. Das vinte e sete interpretações que Fletcher deu para as figuras nos fac-símiles (pag. 25-30), apenas duas são com certeza corretas, enquanto oito estão certamente erradas, o restante é muito provável que esteja errado também. No presente momento, é provável ser mais importante que se determine um método para verificar o que os antigos Egípcios, que desenharam os fac-símiles, tinham de entendimento por eles. Eu publiquei esta metodologia há algum tempo. Quando escrevi especificamente sobre hipocéfalos, a mesma metodologia precisou ser usada por todos os fac-símiles. A metodologia compreende quatro passos:

Passo 1: Se quisermos entender a iconografia dos fac-símiles, nós precisamos dar especial atenção àquelas instâncias que os Egípcios usavam para identificar uma figura.2 Como resultado, nós precisamos reunir vários exemplos de paralelos para os fac-símiles e determinar quando, se sempre, as figuras são identificadas.3 Todos os paralelos devem ser do tempo dos fac-símiles e não milhares de anos antes do Império Novo, Império Antigo ou Império Médio. Os paralelos devem ter a maior precisão possível, preferencialmente com pelo menos metade das figuras iguais ao dos fac-símiles. Se, depois de reunirmos vários paralelos aos fac-símiles, algumas figuras ainda ficarem sem identificação, qualquer identificação que nós atribuirmos será mera suposição.

Passo 2: "A identificação das figuras não nos dirá a respeito do que os antigos Egípcios entendiam das figuras. Essa compreensão virá a partir da reunião de antigas fontes egípcias da época apropriada. Fontes do Império Novo, Império Antigo e Império Médio são apenas de valor secundário para entender o que se entendia por essas figuras no período XXVI da Dinastia Egípcia ou período Greco-Romano.4 A maioria dos manuais de iconografia e acordos religiosos principalmente do Novo Império ou antes, são de pouca ajuda para se entender os fac-símiles.

Passo 3: As várias figuras são dispostas em relação uma às outras por uma razão. Deve-se, portanto, prestar atenção ao posicionamento das figuras. A respeito disto, as explanações nos registros Greco-Romanos que mencionam as relações entre as figuras, podem ser de alguma importância.5 Precisamos, portanto, nos esforçar para sermos capazes de identificar não apenas uma figura em particular, mas também sermos capazes de entender o porque duas figuras estão dispostas de particular modo, relacionando-se entre si nos fac-símiles.

Passo 4: Um esforço deve ser feito, sempre que possível, para combinar as figuras identificadas com os textos que se relacionam com elas, se dizem a mesma coisa ou não.6

Fletcher não seguiu nenhum desses passos. Seus argumentos e conclusões sobre o assunto são metodologicamente inválidos. Mas ele está em boa companhia, desde então alguns egiptólogos tem produzido uma explanação metodologicamente válida para os fac-símiles, como explanação para cada um dos fac-símiles ou da classe de objetos ou vinhetas paralelas. Assim, a substituição de X=Z por X=Y é particularmente perniciosa.

Uma tabela mostrará as diferenças das interpretações de diversos autores, usando diferentes métodos pode ilustrar a diferença que o método proposto pode fazer. A tabela dá identificações publicadas do hipocéfalo (Fac-símile 2) de Louis Speleers,7 Edith Varga,8 antigas identificações Egípcias,9 e Fletcher (pag. 27—29):

Tabela 1. Várias interpretações das figuras no fac-símile 2


Speelers (1943)

Varga (1998)

Ancient Egyptian Identifications in Gee (2001)

Fletcher (2006)

(pp. 27—29)

Figura 1

a alma de Rá e suas três formas

deidade cabeça de carneiro quadripartida

alma vindo para a existência (bɜ m pr) / Senhor em [temor] ou [reverência] ("lord in dread") (nb m šfy) [os dois rótulos são ambos encontrados no mesmo hipocéfalo]

Khnum

Figura 2

ele que está no seu disco / ele que protege seus raios

o único que criou a si próprio

pertencente a vida da salvação (ny-ʿn-wɜ.t) / Eu sei ; Eu sou conhecido (w r=y w r.kw) [os dois rótulos são encontrados em diferentes hipocéfalos]

Amon-Rá

Figura 3

Horakhte

o senhor da embarcação (navio) divina

Ísis, Néftis e Khepri (ỉs.t, nb.t-w.t, prỉ)

Figura 4

Sokaris

[sem identificação]

Bibiou (bɜ-bɜ.w)

Sokar

Figura 5

Mehetweret or Hathor

Uma vaca

A grande vaca que aborreceu o sol (.t wr.t ms rʿ)

Hathor

Figura 6

Os quatro filhos de Horus

Os quatro filhos de Horus

Imseti, Hapi, Duamutef, Qebehsenuef (ỉmstỉ, py, dwɜ-mw.t=f, b-sn.w=f)

Os quatro filhos de Horus

Figura 7

Nehebkau e os mortos

O Senhor do Universo e Nehebkau

O grande Deus (nr ʿɜ)

Min-Horus

Figuras 22—23

Dois gênios lunares

babuínos

babuínos (httyw)

Dois Macacos do amanhecer

Pode-se notar que, com exceção da figura 6, há pouca coincidência entre as várias interpretações. Deve-se notar também que este é apenas o processo de identificação das figuras, mas nada diz o que os antigos Egípcios do período Greco-Romano entendiam a respeito da compreensão delas.

As identificações de Fletcher quase não têm ligação com as identificações dos antigos Egípcios ou com as erradas interpretações egiptológicas. Como resultado, qualquer que seja a homilia que ele construir baseada nas suas identificações, por mais edificantes que possam ser não há reais conexões com os fac-símiles. O mesmo pode ser dito das suas identificações para as figuras no outro fac-símile do Livro de Abraão. Nunca se saberia, usando o método Fletcher, que cada um dos fac-símiles está conectado com Abraão segundo os antigos Egípcios.10

Pressupostos Subjacentes

Para mim, um dos aspectos mais interessantes das obras sobre o Livro de Abraão são os diversos pressupostos tácitos feitos pelos autores sobre o Livro de Abraão ou fac-símiles. Esses pressupostos sempre floreiam, e na maioria esmagadora dos casos guiam, o trabalho. No entanto, raramente são explicitados esses pressupostos. Na maioria dos casos são comprovadamente falhos ou, pelo menos, abrem questão. Na leitura do livro de Fletcher identifiquei várias pressuposições implícitas que Fletcher aparentemente fez para no mínimo apenas abrir uma discução. Mas um pressuposto imperialista que predomina os livros trás a tona uma questão que vale a pena levantar.

Neste mesmo artigo, referi-me sobre o desejo de saber a resposta da seguinte pergunta: A interpretação de Joseph coincide com a interpretação dos antigos egípcios, ou X=Y? Sabemos que as interpretações dos egiptólogos geralmente não coincidem com a dos antigos Egípcios (Z =Y) ou de Joseph Smith (Z =X) e por isso elas são simplesmente irrelevante para a questão. Mas a pressuposição que não quer calar é que se a interpretação de Joseph Smith coincide com a interpretação dos antigos Egípcios (X=Y). Esta pressuposição é relacionada com as pressuposições e teorias (ambas formais e informais) sobre a natureza dos fac-símiles.

Muitas das teorias não requerem que as interpretações de Joseph Smith seja a mesma ou aproximada a essas dos antigos Egípcios. Por exemplo, interpretações dos antigos Judeus de várias cenas Egípcias são conhecidas por diferirem consideravelmente das interpretações dos antigos Egípcios e que os métodos dos Egiptólogos não nos dá nenhuma pista.11 Antes que quaisquer conclusões possam ser tiradas de quaisquer comparações, uma pergunta precisa ser respondida: por que as interpretações de Joseph Smith precisam coincidir com as interpretações dos antigos Egípcios em tudo?

Conclusões

O livro de Fletcher pode ser útil na extensão que ele foi feito. Parafraseando o que escrevi em outro lugar: Se nós ignorarmos as identificações dos antigos Egípcios das figuras dos fac-símiles, nós vamos construir uma compreensão dos fac-símiles que não retrata a compreensão dos antigos Egípcios. Não vamos, em curto prazo, entender tudo.12 Finalmente, encontrei poucas semelhanças do livro de Fletcher com as interpretações das figuras dos antigos Egípcios. Podemos ressaltar uma conclusão temporária: Até o momento não há interpretação metodologicamente aceita de qualquer um dos fac-símiles de um ponto de vista do Egito antigo.13 Muito trabalho há de ser feito antes que possamos compreender os fac-símiles em um ambiente do antigo Egito e só então poderá vir a questão de se a compreensão deles coincidem com a de Joseph Smith.

1. John Gee, "Towards an Interpretation of Hypocephali," in "Le lotus qui sort du terre": Mélanges offerts à Edith Varga, Bulletin du Musée Hongrois des Beaux-Arts Supplément-2001 (Budapest: Musée Hongrois des Beaux-Arts, 2001), 325—34.

2. Gee, "Towards an Interpretation of Hypocephali," 330.

3. For this first step applied to hypocephali, see Gee, "Towards an Interpretation of Hypocephali," 332—34.

4. Gee, "Towards an Interpretation of Hypocephali," 330. I have changed one article in the quotation from definite to indefinite.

5. Gee, "Towards an Interpretation of Hypocephali," 331.

6. Gee, "Towards an Interpretation of Hypocephali," 331.

7. Louis Speleers, "Le sens de nos deux hypocéphales égyptiens," Bulletin des Musées Royaux d'Art et d'Histoire 1 (1943): 35—37.

8. Edith Varga, Napkorong a fej alatt (Budapest: Akadémiai Kiadó, 1998), 140—44.

9. Gee, "Towards an Interpretation of Hypocephali," 332—34.

10. See Janet H. Johnson, "The Demotic Magical Spells of Leiden I 384," Oudheidkundige mededelingen uit het Rijksmuseum van Oudheden te Leiden 56 (1975): 33, 48; Janet H. Johnson, "Louvre E3229: A Demotic Magical Text," Enchoria 7 (1977): 94, 96; John Gee, "References to Abraham Found in Two Egyptian Texts," Insights (September 1991): 1, 3; John Gee, "Abraham in Ancient Egyptian Texts," Ensign, July 1992, 60—62; John Gee, "Abracadabra, Isaac and Jacob," Review of Books on the Book of Mormon 7/1 (1995): 19—84; John A. Tvedtnes, Brian M. Hauglid, and John Gee, eds., Traditions about the Early Life of Abraham (Provo, UT: FARMS, 2001), 501—2, 523; John Gee, "A New Look at the ʿn pɜ by Formula," Proceedings of IXe CongrÅ“s International des Études Démotiques (forthcoming).

11. Kevin L. Barney, "The Facsimiles and Semitic Adaptation of Existing Sources," in Astronomy, Papyrus, and Covenant, ed. John Gee and Brian M. Hauglid (Provo, UT: FARMS, 2005), 107—30.

12. Gee, "Towards an Interpretation of Hypocephali," 330.

13. Gee, "Towards an Interpretation of Hypocephali," 325—34, provides identification only but does not make the further step into interpretation. I have two other articles currently in press that deal with aspects of steps 3 and 4 for Facsimile 2, and part of step 4 for Facsimile 3; see Gee, "A New Look at the ʿn pɜ by Formula," and John Gee, "Non-round Hypocephali," in Aegyptus et Pannonia III, ed. Hedvig Györy (Budapest: MEBT-OEB, 2006), 41—57.

Este artigo é de inteira responsabilidade do autor. A tradução é livre. E a intenção é a melhor possível. Caso tenha algum tipo de ajuda a prestar, pode me contatar em milton_sudrp@yahoo.com.br

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